O presidente da Câmara destacou que não entra no mĂ©rito da fala dos parlamentares, mas ressaltou que os discursos na tribuna da Câmara não podem ser cerceados, e citou o caso do deputado Moreira Alves, cassado depois de proferir discurso, em 1968, denunciando a ditadura. Dias depois, o regime editou o Ato Institucional nÂș5 (AI-5), suspendendo os direitos e garantias polĂticas e individuais no paĂs.
"Recordo aqui o caso do deputado Moreira Alves, que, durante o regime militar, foi alvo de retaliação justamente por sua coragem em defender a democracia e os direitos dos cidadãos. Sua cassação, baseada em discursos feitos na sagrada tribuna desta Casa, marcou um dos episódios mais sombrios de nossa história legislativa e serve como um alerta constante para nós. Aqueles que tentam restringir nossa liberdade de expressão legislativa desconsideram os danos profundos que essa prĂĄtica causa ao Estado DemocrĂĄtico de Direito", afirmou Lira.
O presidente da Câmara disse ainda que vĂȘ com grande preocupação o indiciamento dos parlamentares por discursos proferidos na tribuna, defendeu a imunidade material dos deputados e afirmou que tomarĂĄ medidas para defender as prerrogativas da Casa.
"Não se pode cercear o direito fundamental ao debate e à crĂtica em tribuna, mediante ameaças de perseguição judicial ou policial. O Parlamento não Ă© e não pode ser alvo de ingerĂȘncias externas que venham a coibir o exercĂcio livre do mandato", destacou o presidente da Câmara, acrescentando que "nossa voz Ă© a voz do povo, e ela não serĂĄ silenciada".
O deputado Marcel van Hatten disse que foi indiciado por calĂșnia e difamação ao afirmar, em agosto deste ano, que o delegado FĂĄbio Alvarez Shor estaria fraudando as investigações contra o ex-assessor da PresidĂȘncia no governo Jair Bolsonaro, Filipe Martins, preso por suposta tentativa de golpe de Estado.
"Eu quero que as pessoas saibam, sim, quem Ă© esse dito policial federal que fez vĂĄrios relatórios absolutamente fraudulentos contra pessoas inocentes, inclusive contra Filipe Martins", afirmou da tribuna Hatten enquanto segurava uma foto do delegado da PF.
O deputado Cabo Gilberto Silva disse que tambĂ©m foi indiciado por "denĂșncias na tribuna da Câmara dos Deputados sobre a conduta do delegado FĂĄbio, que estĂĄ à frente de vĂĄrios inquĂ©ritos ilegais contra inocentes brasileiros".
Procurada, a PolĂcia Federal informou que não se manifesta sobre investigações em curso.
O deputado Arthur Lira e os deputados indiciados citam, em suas defesas, o Artigo 53 da Constituição, que define que "os deputados e senadores são inviolĂĄveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos".
A jurisprudĂȘncia do Supremo Tribunal Federal (STF), no entanto, prevĂȘ alguns limites à imunidade parlamentar. No inquĂ©rito que apura a suposta organização criminosa criada para atacar o STF e o processo eleitoral brasileiro, o chamado inquĂ©rito das fakes news, o ministro Alexandre de Moraes diz que "a jurisprudĂȘncia da Corte Ă© pacĂfica no sentido de que a garantia constitucional da imunidade parlamentar material somente incide no caso de as manifestações guardarem conexão com o desempenho da função legislativa ou que sejam proferidas em razão desta; não sendo possĂvel utilizĂĄ-la como verdadeiro escudo protetivo para a prĂĄtica de atividades ilĂcitas".
Em outro julgamento, em 2020, o então ministro do STF Marco AurĂ©lio afirmou que "a imunidade parlamentar pressupõe nexo de causalidade com o exercĂcio do mandato".
"Declarações proferidas em contexto desvinculado das funções parlamentares não se encontram cobertas pela imunidade material", argumentou o ministro na ocasião.
Em caso julgado em 2017, a ministra do STF Rosa Weber ponderou que "a verbalização da representação parlamentar não contempla ofensas pessoais, via achincalhamentos ou licenciosidade da fala".
Outras manifestações do STF sobre a imunidade parlamentar prevista no Art. 53 podem ser consultadas na pĂĄgina do STF.